Uma decisão inédita do Judiciário paulista permitiu ao Grupo GTEX, do setor de produtos de limpeza, converter sua recuperação judicial em recuperação extrajudicial, após processo de mediação. A mudança foi autorizada pela juíza Andréa Galhardo Palma, da 2ª Vara Regional de Competência Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem.
A conversão, embora não prevista na Lei nº 11.101/2005, foi aceita com base na anuência da maioria dos credores – mais de 57% do valor total dos créditos, o que equivale a R$ 180,2 milhões. A maior credora, a Multiplik, sozinha detinha R$ 109 milhões e também foi responsável por conceder financiamento DIP equivalente à dívida da empresa.
O pedido inicial de recuperação judicial havia sido feito em outubro de 2024, com passivo de R$ 345,1 milhões. Em novembro, a homologação do processo judicial facultou às partes o uso da mediação, conduzida pela Câmara Med Arb-RB. O acordo evoluiu rapidamente: em dois meses, a GTEX formalizou o pedido de conversão com apoio do quórum necessário.
A juíza considerou que, uma vez homologada a desistência da recuperação judicial, o artigo 161, §3º, da lei de insolvência – que impede recuperação extrajudicial com processo judicial pendente – não se aplicaria. Sete credores, incluindo Itaú e Caixa, contestaram a legalidade da medida, alegando insegurança jurídica. A magistrada, no entanto, rejeitou os argumentos.
Segundo a administradora judicial Joice Ruiz, a medida representa inovação, ainda que não haja previsão legal expressa. “Não tem previsão na lei, mas também não tem proibição, e isso sim seria um empecilho”, afirmou, posicionando-se favoravelmente ao pleito.
O advogado Otto Gübbel, representante da GTEX, afirma que a mudança de estratégia foi decisiva para a retomada da empresa. “A conversão só foi possível porque o Judiciário apoiou a mediação. Agora, voltamos a faturar R$ 100 milhões por mês, mesmo patamar de antes da crise.”
Para a advogada Samantha Longo, do Fórum Nacional de Recuperação Empresarial e Falências (Fonaref/CNJ), o caso inverte a lógica tradicional – em geral, empresas migram da extrajudicial para a judicial, não o contrário. “Mas aqui houve mediação. E isso fez a diferença”, destacou.
Dados da FGV mencionados no processo indicam que a recuperação extrajudicial é, em média, 1 ano e meio mais rápida que a judicial. Também é menos onerosa, já que não exige, necessariamente, a figura de um administrador judicial.
A decisão marca um precedente relevante no campo da mediação empresarial, sinalizando uma possível mudança de paradigma na reestruturação de empresas em crise.